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COMO CONSOLAR VIÚVAS

Ficção, 1976, 35 mm, cor, 97 min, longa-metragem

 
 

O ator Aquiles d’Almeida Torres vive de golpes. Ao ler no jornal que três milionários desapareceram em um acidente aéreo, ele arquiteta um plano para ficar rico. Com a ajuda do mordomo Vitório e do seu talento dramático, ele se passa pelos falecidos maridos e tira proveito das três viúvas solitárias. Sedentas por sexo, elas não resistem e entregam-se aos “fantasmas”, apesar da vigilância da severa Tia Dadá.

Mojica fez muito bem em assinar o filme com o pseudônimo de J. Avelar, tal a distância e a proximidade entre esta comédia e os filmes de terror que o consagraram como diretor. Como consolar viúvas traz elementos muito mojiquianos, e seu espírito, apesar do título e da obediência às convenções da comédia erótica, está próximo das chanchadas. Contudo, o filme não perde o sobrenatural como referência.

Por “mojiquiano” chamamos aqui, por exemplo, a existência de um quatrocentão gastador, Aquiles d’Almeida Torres, que, apesar do nome, tem cara de varzeano e gasta seu dinheiro em boates vagabundas. O imaginário dos pobres sobre a riqueza é uma constante nesses filmes, e Mojica o maneja com desenvoltura, provendo Aquiles de um bem-humorado e fiel mordomo, que, por exemplo, não se incomoda de não receber salários há uma pancada de tempo. Ele parece se divertir com as vigarices do patrão, ou, por outra, ele está lá para ser seu cúmplice.

A oportunidade de resolver a caótica situação financeira do quatrocentão aparece quando ele descobre que os três genros de um ricaço morreram num desastre de avião. Quanto a nós, logo ficamos cientes de que as viúvas não estão lá para chorar a morte dos maridos. Elas vivem excitadas em tempo integral. O pai é, evidentemente, um moralista que lamenta os novos tempos, usa camisas inacreditáveis, porta uma costeleta idem e mantém um centro de estudos experimentais da mandioca. O duplo sentido abunda. Aquiles lança-se em sua empreitada: fazer-se passar pelos fantasmas dos maridos. Aparentemente, não é necessário ter grande semelhança com os ditos cujos. As viúvas estão dispostas a acreditar em qualquer coisa. Logo, as preocupações financeiras do vigarista evaporam, e o gênero comédia erótica funciona furiosamente.

É quando se dá a cena da luta de Aquiles contra o vibrador. Mojica aproxima o sobrenatural e a comédia picaresca, e daí por diante o encontro entre essas duas linhas dará o tom do filme.

A presença de um padre com sotaque espanhol e ares de exorcista, chamado Levedo, talvez hoje não seja bem compreendida: trata-se de referência ao famoso padre Quevedo, que ganhou evidência ao explicar fenômenos paranormais dentro dos parâmetros da normalidade (isto é, do catolicismo): talvez uma pequena vingança de Mojica contra a vulgarização do além promovida por esse padre.

Nessa comédia bem tramada, será justo notar a existência de um roteiro bem armado e de diálogos muitíssimo acima da média dos filmes brasileiros. Uma comédia que Mojica parece ter se divertido muito em fazer. Em tom chanchadesco, ele conseguia de certa forma vingar-se da censura. Isso se dá também na seqüência final, em que o castigo do pícaro chega desse outro mundo que,afinal, faz parte do autor.

Inácio Araújo