Portal Brasileiro de Cinema  BONITINHA MAS ORDINÁRIA

BONITINHA MAS ORDINÁRIA

J. P. de Carvalho
RIO DE JANEIRO, 1963, P&B, 35 MM., 100 MIN.

 

A peça Bonitinha, mas ordinária (1962), pensada primeiramente como argumento cinematográfico, possui um caráter exemplar. A hesitação de Edgard diante do gordo cheque oferecido pelo dr. Werneck em troca do casamento com sua filha violada é motor da engrenagem que movimenta ressentimento, culpa, degradação e redenção. A proximidade com o Dostoievski de O idiota é evidente. Na peça de Nelson Rodrigues, a força dos personagens subverte a simplicidade da parábola moral e esboça uma sátira da modernização conservadora. Edgard e Ritinha chupando Chicabom após um conflito ou a leitura de Querida e a discussão de questões familiares entre Ritinha e suas irmãs.

No filme, ganha espaço o naturalismo mais convencional, embora a criatividade dos diálogos permaneça e a interpretação de Fregolente (dr.Werneck) surpreenda. Bonitinha, mas ordinária é um bom exemplo do "desrecalque" sexual que o cinema brasileiro do início dos anos 60 promoveu. Os corpos ganham um tratamento melhor (destaque para Odete Lara) e os diálogos despudorados (Fregolente e Jece Valadão) viram um acontecimento. A cena em que o dr.Werneck é apresentado de toalha é digna de nota pelo teor cômico grotesco. Com seus trejeitos advindos da comédia cinematográfica popular, Fregolente cria um tipo que resume bem a fauna de Nelson Rodrigues: o burguês boçal. Esse dr.Werneck, irônico e impiedoso, vai imprimir no filme um tom de crueldade implacável, que depois servirá de base para as interpretações do ator nas futuras comédias eróticas.

 

Se por um lado o filme mercantiliza a grife Nelson Rodrigues, por outro a aclimatação dos diálogos do dramaturgo vai ser decisiva para composição do som e da imagem no cinema brasileiro, ainda em fase de experimento naquela época.

Adilson Inácio Mendes

PRODUTORA: Magnus Filmes

PRODUÇÃO: Jece Valadão e Joffre Rodrigues

ARGUMENTO E ROTEIRO: Jece Valadão

FOTOGRAFIA: Amleto Daissé

MONTAGEM: Rafael Justo Valverde e Lúcia Erita

MÚSICA: Carlos Lyra

ELENCO: Jece Valadão, Odete Lara, Ambrósio Fregolente, Angela Bonatti, Ribeiro Fortes, Ida Gomes, Sandra Menezes, Maria Gladys, Roberto Batalin