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Vrai faux passeport

França, 2006, p/b & cor, vídeo, 55’



Vídeo-montagem de diferentes trechos de filmes, cinejornais, reportagens televisivas, entrevistas etc. Com as palavras “bonus” e “malus” se alternando na tela, Godard inscreve sobre as imagens o seu julgamento, convidando o espectador a também se posicionar diante delas, estética e moralmente.

Vrai faux passeport é um dos filmes mais obscuros e inclassificáveis de Godard. Concebido originalmente para a exposição “Voyage(s) en utopie, 1946-2006”, apresentada no Centro Georges Pompidou entre maio e agosto de 2006. A ideia inicial era que Godard realizasse sete filmes para a exposição. Mas ele acabou entregando alguns vídeos assinados por Anne-Marie Miéville, além de dois trabalhos anteriores requentados (Une bonne à tout faire e Je vous salue Sarajevo ). O único filme novo de Godard para a exposição é Vrai faux passeport.

“De acordo com Santo Agostinho, a verdade é tão amada que mesmo os mentirosos querem vê-la no que dizem.” Esta frase, dita no início – a única fala de Godard no filme (as demais sentenças tipicamente godardianas aparecerão apenas como frases escritas na tela) –, introduz um tema caro ao cineasta: a obsessão dos ocidentais com a “imagem verdadeira”. A questão existe desde sempre, mas ganhou novo impulso com a fotografia e o cinema (e, mais tarde, com a televisão), na medida em que esses meios prometeram uma relação de objetividade entre as imagens e o mundo por elas representado, que aí apareceria isento de interpretação e deformação. Essa crença, contudo, não tardaria a demonstrar seu avesso cúmplice: a suspeita de que as imagens da fotografia e do cinema não falam sempre a verdade, ou, mais ainda, de que sua vocação original pode ser iludir e mentir. Diante disso, não cabe mais utilizá-las como meio de acesso à verdade, mas separá-las entre boas e más imagens. Eis por que neste filme Godard logo desiste do binômio vrai/faux (verdadeiro/falso) em nome de outro, bonus/malus, que decorre de um trocadilho neologista com a ideia de “bônus”, tão amada no mundo das imagens (o bonus material...).

O trabalho de Godard consistirá em encadear uma série de samples visuais e sonoros, trechos de materiais extraídos de outros filmes, segmentos de reportagens, entrevistas, transmissões esportivas, etc. Antes, durante ou depois das imagens, surge na tela uma das duas inscrições, bonus ou “malus”, aprovando ou desaprovando as imagens, respectivamente. Godard age tal um imperador romano, levantando ou abaixando o polegar para as imagens que desfilam na tela. Bonus para a cena do suicídio do menino em Alemanha, ano zero (Rossellini, 1948), para a cena final de Pickpocket (Bresson, 1959), para o momento da ressurreição em Ordet (Dreyer, 1955), para a cura do leproso em O Evangelho segundo São Mateus (Pasolini, 1964), para A estrada da vida (Fellini, 1954). “Malus” para um discurso de André Malraux, para Cães de aluguel (Tarantino, 1992), para o gestual agressivo de uma tenista e de seu treinador, para a sequência de Intervenção divina (Elia Suleiman, 2002) em que uma ninja palestina atira dardos em soldados israelenses.

A princípio, Godard alterna um bonus e um “malus” numa espécie de campo-contracampo entre o bem e o mal, executado só com imagens de arquivo (agrupadas em blocos temáticos: “Os Deuses”, “História”, “Tortura”, “Liberdade”, “Infância”, “Política”, “Terror”, “Milagre” etc). M, mas a sistematicidade maniqueísta logo se perde. Três bonus podem se suceder e depois ainda serem coroados por um super bonus” - Ava Gardner de maiô em A condessa descalça (Mankiewicz, 1954). No terço final do filme, os carimbos simplesmente deixam de existir, ou aparecem de forma ambígua, aberta à interpretação do espectador. O fotógrafo Luc Delahaye, autor de muitas imagens impactantes feitas em Sarajevo durante a Guerra da Bósnia, dá uma entrevista afirmando que podia fazer seu trabalho “sem má consciência”, pois as equipes de resgate chegavam muito rápido para socorrer as vítimas que ele fotografava. Corta para uma mulher que conta como foi fotografada por ele enquanto tentava se erguer dos escombros de um bombardeio para ajudar o pai, gravemente ferido. “Por que ele não me ajuda, em vez de ficar fazendo fotos?”, ela disse que se perguntava ao viver aquela situação. Godard não acrescentou seu julgamento à entrevista de Delahaye. Já o depoimento da mulher foi seguindo de um duplo bonus. Os dois bonus são para ela? Ou devemos dividi-los, um para o fotógrafo e outro para a mulher que ele fotografou, mas não ajudou? Godard espera que, àquela altura, o espectador já tenha aprendido a julgar por si mesmo. Pedagogia godardiana. Mais adiante, um jogo de analogias se estabelece entre um filme de propaganda stalinista, a cena final de O paraíso infernal (Hawks, 1939) e a imagem aérea de um bando de pássaros voando num documentário estilo Discovery. Também não há carimbo de “bonus” ou “malus” para essas imagens: elas falam por si mesmas – o juízo estético assume a forma de um puro pensamento visual.

Luiz Carlos Oliveira Jr.



Produção

Apoio

Correalização

Copatrocínio

Realização


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