Portal Brasileiro de Cinema O ACORDO (1º episódio de TRILOGIA DO TERROR)
O ACORDO (1º episódio de TRILOGIA DO TERROR) Ficção, 1968, 35 mm, P&B, 42 min Mulher faz acordo com o Diabo, no qual, em troca de proteção
para a família, ela terá de entregar uma virgem ao demônio. Ozualdo Candeias costuma dividir sua obra entre os filmes que são e os que não são cem por cento seus. O acordo, entretanto, não se encaixa prontamente em nenhuma dessas classificações, trata-se de uma encomenda: como os filmes de terror de Mojica vêm rendendo um bom dinheiro, Candeias é chamado para dirigir um episódio que lide de alguma forma com o fantástico, e essa é a única restrição, temática ou estilística, que lhe é dada. No mais, tem o direito de fazer o que quiser.
Essa indecisão sobre o direcionamento a ser dado cria um filme curioso: O acordo é uma espécie de continuação de A margem e um teste em média-metragem para Meu nome é Tonho. Difuso no início (como em quase toda a obra de Candeias, onde as regras do jogo são dadas à medida em que são necessárias, jamais antes), e com uma trama de horror sobrenatural que está longe de ser um dos atrativos da fita, O acordo se desenvolve mais como um elogio da pureza de sentimentos, como no encontro final entre uma linda virgem e um estranho pastor, que a salva das mãos de todos os camponeses hipócritas do vilarejo, e termina se revelando como uma possível reencarnação de Jesus Cristo (ou será que se trata apenas de mais um louco?). Em Trilogia do terror, Candeias faz como Luiz Sérgio Person, no mesmo filme: longe de seu território de interesse, o jeito é adicionar algumas regras do gênero horror, e, no mais, seguir seu próprio caminho. Em O acordo, há risos ma-quiavélicos e gurus, mas o que há de mais interessante na apropriação do universo do cinema fantástico por Candeias é o uso das crenças locais, nacionais, e não da tradição européia de vampiros, monstros ou lobisomens. Se há horror, ele vem do rosto desfigurado de um homem possuído por um espírito. Sob esse aspecto, o filme já antecipa a “verdeamarelização” de Hamlet em A herança.
Mas o terror é apenas peça acessória no filme. O acordo é mais uma espécie de laboratório, de visita ao ateliê-Candeias: iniciando com o dispositivo de câmera subjetiva de A margem, o filme caminha aos poucos para um começo de bangue-bangue, como em Meu nome é Tonho, e introduz a violência física/sexual entre homens e mulheres, como em Zézero e Aopção. Se não é a última palavra sobre o cineasta, O acordo pode muito bem ser tratado como a primeira. Ruy Gardnier Direção e roteiro: Ozualdo R. Candeias. Fotografia: Peter Overbeck. Montagem: Silvio Renoldi. Música: Damiano Cozella. Produção: Antonio Polo Galante. Cia. produtora: Nacional Filmes, Companhia Cinematográfica Franco-Brasileira e Produções Cinematográficas Galasy. Elenco: Lucy Rangel, Regina Célia, Alex Ronay, Durvalino de Souza, Luiz Umberto, Ubirajara Gama, Nádia Tell, Eucaris de Morais, Henrique Borges e José Júlio Spiewak. 2º Episódio: Procissão dos mortos de Luiz Sérgio Person. 3º Episódio: Pesadelo Macabro de José Mojica Marins. |