Portal Brasileiro de Cinema  NA BOCA DA NOITE

NA BOCA DA NOITE

1970 . Walter Lima Jr.
Rio de Janeiro, 80 minutos, 35mm, p&b

 

“De alguma maneira, eu devia essedepoimento. Meu irmão estava preso. [...] Companheiros de cinema sentiam-se demãos atadas. As coisas estavam desabandoem cima de nossas cabeças. Eu não tinhanenhum compromisso político formal, só umaraiva emocional”, Walter Lima Jr. Pois é essaraiva emocional do diretor, entrelaçada comtoda a carga política de Rubens Corrêa ecom a ingenuidade maliciosa de Ivan Albuquerque, que confere a Na boca danoite seu caráter especial: a imagem espontânea, as palavras jorrando da boca dos personagens/atores e se jogando sobre o espectador. Uma rudeza, uma sujeira que dá ao filme seu caráter de emergência, de grito consistente, porém perdido... O que se vê é mais do que a história de dois homens numa agência bancária — o que se vê são dois atores e um diretor se desfazendo e refazendo em filme, em prol de um grito engasgado e difícil de expressar. Num dos momentos mais fortes da narrativa, Rubens Corrêa fala para a câmera sobre a própria sala de cinema (“essa luz que passa sobre suas cabeças”) como um produto do trabalho humano, como uma construção calcada no esforço e na vontade de quem a realiza. E é dessas prisões construídas que o filme fala, não como um manifesto supostamente racional ou didático — mas como uma explícita oratória emocionada e tocada por aquela mesma realidade que se critica. Na boca da noite não pretende explicar o que se passa, não tenta mostrar sua crítica como uma revelação da verdade dos fatos, da real situação do país naquele momento; torna-se, assim, muito mais rico do que a possível tentativa de uma ironia crítica ou de um planfletarismo didatizante. Uma emergência que engloba texto, atuação, câmera e cenografia num mesmo e doloroso grito. Um grito na noite.

Felipe Bragança

Cia. produtora: Mapa Produções Cinematográficas

Produção: Zelito Viana

Direção e roteiro: Walter Lima Jr. Adaptação da peça de José Vicente “O assalto”

Fotografia: Leonardo Bartucci

Montagem: Pery Santos

Cenografia: João R. Camargo

Música: Gato Barbieri

Elenco: Rubens Corrêa, Ivan Albuquerque